by Sérgio Godinho
Postcards.from.Bodyland
O meu corpo é a minha Terra. Poema sinuoso de gestos e instantes com que falo. Casa onde moro que habita, suscita e acende o prazer. Alfabeto do amor, da idade e dos sentidos. Pétala e pele. Chama e abraço. Arma e astro. Carne e grito incontornável da dor. Coração e pegada de segredo e silêncio. Paisagem onde me procuro, me vejo e encontro. Dança alada de mãos dadas a ti. Fronteira e nascente. Amanhecer e poente. My body is my land. Em tantas línguas, lugar universal.
sexta-feira, 28 de março de 2025
walking and falling
domingo, 2 de março de 2025
Por portos seguros
by Fernando Pita
Por portos seguros e em zonas de conforto.
Trata-se do aqui e agora (o que é), para trás nostalgia (pelo que foi) e melancolia (pelo que ficou por ser), para a frente expectativa (pelo que poderá vir a ser) ou fantasia (sobre o que nunca será).
Fernando Pita
00:00:01 Baby Rose | Landslide (Fleetwood Mac)
00:08:31 Sia & Zero 7 | Up With People @ KCRW 2002 (Lambchop)
00:07:59 Bill Fay | Cosmic Concerto (life is people)
00:15:39 Smog | All Your Women Things
00:22:14 Gem Club | Soft Season (live radio)
00:27:24 The Delines | The Haunting Thoughts
00:30:50 The Delines | Don't Miss Your Bus Lorraine
00:34:12 The Cranberries | (They Long To Be) Close To You (The Carpenters)
00:36:39 Ane Brun | Undertow
00:42:55 Brad | Believe In Yourself (2010)
00:47:10 English Teacher | Albert Road
…obrigado pela partilha, filha Margarida
00:51:50 Alabama 3 | Ain't Goin' To Goa
00:55:32 Pizzicato Five | Twiggy Twiggy [Twiggy vs. James Bond]
00:59:26 Populous & Lucia Manca | Roma (ft. Matilde Davoli)
01:05:32 Guillemots | Through The Window Pane
01:09:08 PPP (aka platinum pied pipers) ft. rogier | 50 ways to leave your lover (Paul Simon)
01:13:06 Lali Puna | Faking The Books (Dntel Rmx)
01:16:29 Ethel Cain | Amber Waves
01:27:09 F.S. Blumm & Nils Frahm | Valentine My Funny (Chet Baker)
01:33:21 La Rue Kétanou | Ouverture
01:36:32 Mon Côté Punk | Barranquillita
01:37:27 Manuel Laisné | Trop!
01:39:12 Nina Maia feat. Chica Barreto | Amargo
01:42:41 Thievery Corporation (ft. Karina Zeviani) | Nós Dois
01:45:29 The One World Orchestra (KLF) | The Magnificent (Elmer Bernstein)
01:47:38 Working Week (ft Robert Wyatt, Tracey Thorn, Claudia Figueroa) | Venceremos
01:56:23 William Orbit | Piece In The Old Style 3 (Henryk Górecki)
Fotografia de Fernando Pita, Avenida
sábado, 21 de dezembro de 2024
In the silence of a heartbeat
by Fernando Pita
00:00:01 Hans Zimmer | God Yu Tekem Laef Blong Mi
00:01:51 Joy Guidry | Angels
00:08:44 Moses Sumney, Lyra Pramuk & Sam Smith | You Make Me Feel (Mighty Real) (Sylvester)
00:14:06 Joshua Idehen & The Social Singing Choir | Once in a Lifetime (Talking Heads)
00:17:38 Lauren Auder & Wendy & Lisa | I Would Die 4 U (Prince)
00:20:55 Joshua Idehen | I Got You Every Step Of The Way
00:23:56 Lewis Taylor | Lucky (Kruder & Dorfmeister Reprise Mix)
00:26:28 Joshua Idehen | Mum Does the Washing
00:30:07 Annahstasia | Stress Test
00:35:04 Mercury Rev | A Bird of No Address
00:39:06 Father John Misty | Screamland
00:45:55 The Cure | And Nothing Is Forever
00:52:36 The Montgolfier Brothers | Between Two Points
00:58:32 Fred again.. & Angie McMahon | light dark light
01:01:34 Clarissa Connelly | Wee Rosebud
01:05:46 Caroline Polachek | True Love Waits (Radiohead)
01:09:51 Porridge Radio | Anybody
01:13:47 Angel Olsen (Sarah Grace White) | Ride
01:17:41 Soccer Mommy | Abigail
01:20:40 Oneohtrix Point Never & ROSALÍA | Nothing’s Special
01:24:02 Manuel Faria & Frankie Chávez | Silêncio
01:26:45 Six Organs of Admittance | Pilar
01:28:41 The Durutti Column | G+T
01:30:05 Underworld | Stick Man Test
01:32:21 Amanda Whiting | Peace Piece (Bill Evans)
01:35:10 Mazgani | A Avenida
01:38:44 MaZela | Entre Amor e Ódio
01:44:35 Helado Negro | Running (Live at Drop of Sun)
01:47:52 Rachika Nayar (feat. Julianna Barwick & Cassandra Croft) | Song to The Siren (Tim Buckley)
01:53:43 Hypnotic Brass Ensemble | Soon It Will Be Fire (feat. Moses Sumney)
Fotografia: "ouro sobre azul" de Margarida Silva
segunda-feira, 9 de dezembro de 2024
per aspera ad astra
by Ema Alba Lobo
domingo, 17 de novembro de 2024
LATE NIGHT JUNCTION
by Jorge Vicente
00:00:01 Surma | Uppruni
00:02:51 Jorge Vicente | Violet – Parte I (Ema Alba Lobo)
00:04:20 Ala dos Namorados| Rosa Negra
00:07:53 Novos Baianos | Acabou Chorare
00:11:59 Martin and Blane | That's How I Love the Blues
00:15:58 Jorge Vicente | Violet – Parte II (Ema Alba Lobo)
00:16:26 Red Norvo & His Orchestra | Remember
00:19:34 The Chantels | My Memories of You
00:21:43 The Marvelettes | Happy Days
00:23:42 Derek & The Dominos | I Am Yours
00:27:10 The Charts | Why Do You Cry
00:29:30 Johnny Ace | Pledging My Love
00:31:53 The Aquatones | You
00:33:49 Jorge Vicente | Violet – Parte III (Ema Alba Lobo)
00:34:36 The Nutmegs | My Sweet Dream
00:36:43 The Jesters | The Wind
00:39:58 Little Caesar & The Romans | Adorable
00:42:18 The Shirelles | Lonely Teardrops
00:44:54 Jorge Vicente | Violet – Parte IV (Ema Alba Lobo)
00:45:59 The Ronettes | Walking In The Rain
00:49:02 Angel Olsen | Who's Sorry Now
00:51:17 Jorge Vicente | Violet – Parte V (Ema Alba Lobo)
00:52:42 Tarnation | Two Wrongs Won't Make Things Right
VIOLET
esqueço-me de abrir as portas do carro. elas estão presas ao pó que circunda o pátio da casa. vou sair. ligo o ar condicionado e espero que a rádio transmita aquelas palavras que, muitas vezes, repetem ao longo da manhã. bom dia. o trânsito está encerrado na estrada 43 e não é bom dia para passear. melhor seria ficar em casa e comemorar a solidão, olhando as pequenas folhas que teimam em se movimentar em pequenos círculos, como se puxadas por um cordel imaginário. lá fora, vivem as pessoas e o seu estranho círculo de relações. ligo o carro e aperto o cadafalso à pedra. muita distância separa o teu corpo das inúmeras sensações que o prazer provoca, mesmo que este seja uma forma nada subtil de enganar a solidão. aperto-me ainda mais na sensação de ter de me movimentar estrada fora e admirar as mulheres que me pedem para adormecer num diner triste e decadente. é lá que vivem as mulheres que querem partir para a estrada 43 sem, ao menos, se importarem se estão despidas ou se são apenas aquilo que a rádio espera que elas sejam: as futuras estrelas do conglomerado urbano.
páro o carro. meto gasolina e vou embora. não. me apetece levar alguém comigo, mesmo que seja inocente e não se possa deter na estranha forma das pessoas viverem o corpo. nesta cidade, não existe dimensão nenhuma que seja de fácil percepção. tudo se resume ao modo como as pessoas fogem. a estrada é apenas o meio. e não o fim.
chama-se violet e tem nome de flor. e também o nome do chakra de ligação com deus, mas talvez não seja isso porque deus não tem corpo e as flores não têm mais nenhum cheiro do que aquele que movimenta o ecossistema das plantas. apetece-me fodê-la. não a flor, mas a rapariga que tudo abarca e que tem o corpo junto à porta do carro. para onde partes. para a califórnia. procurar ouro. não. não procuro ouro nem viagens xamânicas ao deserto. entra. ela entrou. escusado será dizer que não falámos nada. os meus pensamentos falaram tudo. nunca me dirigi a alguém com estrelas nos olhos, mas a quem não tinha nada a perder, como eu.
levei-a a casa. fez as malas rapidamente, apenas com o essencial. e partimos. nunca prometas nada que não possa ser cumprido, se quiseres podes cortar o mundo às postas e transformar o meu pequeno mundo numa selva de esperma e de calos. não falo nada. apenas penso. mas penso com o lado iluminado do meu rosto. olho a paisagem que se desenrola como um filme. ela adormece. a rádio ilumina as árvores que se estendem no limiar das casas. who's sorry now. angel olsen. uma pauta no silêncio numinoso da paisagem americana. nunca é demasiado discreto pedir o amor quando ele só pode dar a solidão. aproximo a mão da pele e os olhos fecham-se e abrem-se. o olhar é uma flor desgastada que se abre quando pressionada pelo toque da pele. tudo se resume ao fogo do prazer e ao movimento da estrada.
páro o carro e saio para fora. o corpo e mais a pele. já é noite acendida e os carros movimentam-se como faróis no meio do mar e dos peixes. os peixes somos nós. que abrem a boca quando querem ejacular o líquido amniótico que se esquecem de escrever enquanto crianças. tiro as calças e deixo que ela engula o que restou de mim enquanto estive na casa. e o que sair será para ela uma forma encantatória de enganar a solidão. porque provavelmente o amor será apenas isso, quando engolimos e deixamos sair. e vomitamos. e voltamos ao estado do leite virginal. e deixamos que o corpo se relembre disso. até cairmos e termos a sensação de que acabámos com a inocência de quem queria apenas partir e não jogar o seu futuro nas estradas e nos corpos alheios. o corpo é só nosso quando perdoamos as nossas faltas. e se a solidão e o amor são o lamaçal da pele, nunca deixamos de ser cadáveres. e fodemos pelos nossos mortos como fodemos pelo nosso sabor metálico. mas lá estou eu a pensar. provavelmente, é mesmo amor, mas com uma diferente intensidade. a partilha da pele e do esperma. só a nossa inocência é que sabe.
Jorge Vicente
Fotografia de Robby Müller, "Santa Fe, Mexico", 1985.